Violência de gênero e racismo no Brasil
Estudo sobre a violência de gênero com recorte específico pela raça/cor das vítimas.
Usando dados gerados pelos departamentos de vigilância em saúde dos sistemas públicos brasileiros e estimativas da Carga Global de Doenças (GBD), a Vital Strategies, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), realizou uma série de estudos para estimar prevalência e subnotificação de violência contra mulheres e meninas no Brasil. O objetivo foi usar as informações existentes para mapear os preditores de violências e feminicídio e, com isso, identificar as oportunidades que foram perdidas pelos serviços de saúde na hora de detectar e prevenir violências.
O estudo teve como objetivo estudar a associação entre a orientação sexual autoidentificada e a violência interpessoal na população brasileira. Para isso, foram analisados dados de 88.531 pessoas com 18 anos ou mais que responderam às questões relacionadas à orientação sexual na Pesquisa Nacional de Saúde de 2019. Entre as respondentes, 94,8% se autoidentificaram heterossexuais e 1,9% se identificaram LGB+.
Apesar de um baixo percentual de pessoas autoidentificadas LGB+, os dados indicam uma maior prevalência de violência nesta população: enquanto a prevalência de violência para a população geral foi de 18,2%, a população LGB+ apresentou 2,52 vezes mais chances de sofrer qualquer tipo de violência.
O estudo analisou dados integrados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) com o objetivo de mapear a trajetória de uma mesma mulher nos diferentes sistemas de saúde, desde as notificações de violência até o registro de óbito.
Foi utilizada uma metodologia de caso-controle, em que os casos estudados foram de mulheres entre 15 e 59 anos com notificação de violência perpetrada por parceiro íntimo e registro de óbito. Este grupo foi comparado ao de controle: grupo de mulheres com notificação, mas sem registro de morte no SIM. Foram consideradas mulheres residentes em 1.104 municípios e o período temporal estudado foi entre janeiro de 2011 e setembro de 2017. A partir destes recortes, o estudo trabalhou com dados de 151.826 mulheres, sendo 149.288 do grupo de controle e 2.538 do grupo de casos.
Entre as causas de morte do grupo de casos, 40,6% estavam relacionadas a agressões. Nesta categoria, se destacam algumas características da violência como:
– O ambiente em que a violência foi perpetrada foi majoritariamente a casa da vítima (74,8%).
– A violência física foi predominante (57,2%).
– Parte significativa das agressões foi perpetrada com uso de objetos perfurocortantes (23,8%) e armas de fogo (10,7%).
– A violência crônica foi observada em 45,4% dos casos.
A partir dessa análise, alguns fatores de risco para a mortalidade foram identificados:
– Faixa etária entre 15 e 29 anos.
– Se comparadas às brancas, mulheres negras têm 1.29 vezes mais chances de morrer e mulheres amarelas têm 3.76 vezes mais chances de morrer.
– Moradoras de regiões rurais e periurbanas.
– Histórico de registro de violência em espaços públicos.
– Histórico de violência física, sozinha ou combinada com outros tipos de violência.
– Em casos em que o agressor usou armas de fogo, a chance de desfecho fatal é 12.52 vezes maior
Por outro lado, alguns fatores protetivos foram identificados, como a gravidez – mulheres grávidas parecem estar sob menor risco de desfecho fatal – e habitar regiões urbanas: quanto maior o tamanho do município, menor o risco de morte.
O estudo teve como objetivo estudar a associação entre a orientação sexual autoidentificada e a violência interpessoal na população brasileira. Para isso, foram analisados dados de 88.531 pessoas com 18 anos ou mais que responderam às questões relacionadas à orientação sexual na Pesquisa Nacional de Saúde de 2019. Entre as respondentes, 94,8% se autoidentificaram heterossexuais e 1,9% se identificaram LGB+.
Apesar de um baixo percentual de pessoas autoidentificadas LGB+, os dados indicam uma maior prevalência de violência nesta população: enquanto a prevalência de violência para a população geral foi de 18,2%, a população LGB+ apresentou 2,52 vezes mais chances de sofrer qualquer tipo de violência.
Principais achados do estudo:
– Mulheres LGB+ apresentaram as maiores prevalências de todos os subtipos de violência e os homens heterossexuais, as menores.
– Mulheres LGB+ têm três vezes mais chances de sofrer violência física se comparadas às mulheres heterossexuais.
– A violência psicológica foi a mais prevalente entre as mulheres LGB+ (40,5%), seguida da violência física (15,8%).
– A população LGB+ tem quase cinco vezes mais chances de sofrer violência sexual do que as pessoas heterossexuais.
– Homens LGB+ têm chances quase oito vezes maiores de sofrer violência sexual que os homens heterossexuais.
– Mulheres LGB+ apresentam quase quatro vezes mais chances de sofrer violência sexual do que mulheres heterossexuais.
Estudo descritivo que analisa a variação da mortalidade e do Disability-Adjusted Life Years (DALY) no Brasil. O DALY mensura os anos de vida perdidos para a morte ou incapacidade e foi estimado a partir do estudo Global Burden of Diseases and Injuries, que comparou os anos 1990 e 2019.
Principais achados do estudo:
– A taxa de mortalidade de mulheres e meninas de todas as idades por violência interpessoal passou da 20ª principal causa de morte em 1990 para 25ª causa em 2019. Apesar da queda, não há diferença estatisticamente significativa entre as taxas dos dois anos, indicando uma estabilidade.
– Para o estrato de mulheres de 15 a 49 anos, em 1990, a mortalidade por violência interpessoal era a 5ª principal causa de morte, tornando-se a 3ª causa principal em 2019.
– Em 1990, a violência interpessoal resultou na morte de 3.168 mulheres na faixa etária de 15 a 49 anos, com uma taxa maior entre aquelas que tinham entre 25 e 29 anos.
– Já em 2019, foram 4.262 mortes, um aumento de 33,8%, sendo a maior taxa de mortalidade entre mulheres de 20 a 24 anos de idade. Ainda em 2019, 55,6% das mortes foram causadas por armas de fogo.
– Comparando os DALYs por violência interpessoal contra mulheres da faixa etária estudada, houve uma queda de 13%, passando de 542,8 anos perdidos entre 100 mil mulheres em 1990 para 472,1 anos perdidos em 1990. Apesar dessa queda, no período, a violência saiu da 11ª posição de causas que geram maiores perdas de anos de vida para a 9ª posição em 2019.
– Comparando diferentes estados brasileiros, a maioria manteve indicadores estáveis, com exceção da Bahia, que apresentou 77,2% de aumento nas taxas de morte por violência interpessoal contra mulheres entre os dois períodos.
– O Distrito Federal, o Rio de Janeiro e São Paulo apresentaram quedas em suas taxas de mortalidade, com variação negativa de 27,9%, 50,7% e 47,6%, respectivamente.
O estudo teve como objetivo caracterizar a violência física perpetrada por parceiros íntimos contra mulheres atendidas em serviços de saúde no Brasil. Para isso, foram utilizados dados do Viva Inquérito, com informações coletadas entre setembro e dezembro de 2017.
Das 713 mulheres entre 18 e 59 anos que receberam tratamento após violência interpessoal, 276 (38,9%) foram agredidas por parceiro íntimo. Em geral, a violência:
– Teve gravidade moderada (85,1%)
– Ocorreu dentro de casa (71,1%)
– Envolveu uso de força física (74,1%)
– Foi direcionada contra a cabeça da vítima (50%)
Perfil das vítimas:
– A maioria das mulheres atendidas por consequências da violência física nos serviços de urgência e emergência eram negras.
– Na maior parte dos casos, suspeita-se que o agressor estava sob influência de álcool.
– Mulheres com maior grau de instrução sofreram traumas e violência de natureza mais grave com maior frequência. Esse dado, apesar de contraintuitivo, pode indicar que mulheres com maior autonomia financeira, ao transgredirem papéis de gênero tradicionais, podem ser “punidas” com violência perpetrada por parceiros.
– Mulheres negras, jovens e/ou que não realizavam trabalho remunerado tenderam a apresentar agressões mais severas.
– A violência com uso de arma de fogo foi mais frequente contra mulheres com menor grau de instrução.
Estudo com o objetivo de estimar a prevalência e os fatores associados à violência por parceiro íntimo contra mulheres adultas no Brasil. Por meio de um estudo epidemiológico transversal, foram analisados os registros de 34.334 mulheres entre 18 e 59 anos.
O estudo mostrou que idade e renda foram as características que apresentaram significância estatística, indicando que são fatores que determinam com maior precisão a prevalência de violência.
Principais achados do estudo:
– Foi identificada uma maior prevalência de violência entre as mulheres mais jovens, entre 18 e 24 anos (aproximadamente 9%), se comparadas às mulheres entre 40 e 59 anos (6%).
– A prevalência entre mulheres com menor grau de instrução foi 26% maior em comparação àquelas que concluíram o ensino médio.
– Entre mulheres que ganham menos de um salário-mínimo por mês, a prevalência foi 65% maior se comparadas às mulheres que ganham mais de 5 salários-mínimos mensais.
– A prevalência foi 25% mais alta entre as mulheres autodeclaradas negras, se comparadas às mulheres autodeclaradas brancas.
– Entre as regiões do Brasil, a Nordeste apresentou a maior prevalência (8,17%), enquanto a região Sul, a menor (6,77%).
A pesquisa teve como objetivo analisar a prevalência da violência sexual contra adolescentes entre 13 e 17 anos no Brasil. Foram utilizados dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), de 2019, inquérito aplicado em escolas públicas e privadas do país pelo IBGE. Ao todo, foram coletados 159.245 questionários válidos, entre os quais 14,6% dos respondentes reportam ter sido vítimas de abuso sexual em algum momento de suas vidas.
Principais achados do estudo:
– A prevalência de violência sexual foi maior entre jovens de 16 a 17 anos (17,4%), entre meninas (20%) e entre alunos de escolas particulares (16,3%).
– A prevalência de estupro foi de 6,3%, sendo mais recorrente na faixa etária de 16 a 17 anos (7,7%) e entre meninas (8,8%), porém desta vez com maior prevalência entre alunos de escolas públicas (6,5%).
– Entre as vítimas, 56,3% relataram ter sido vítimas de estupro antes dos 13 anos de idade e, de uma perspectiva regional:
– Os adolescentes da região Norte foram os que mais relataram ter vivido violência sexual (17,1%).
– Os perpetradores mais frequentes de abuso sexual foram namorados(as), ex-namorados(as), crushes e dates, com exceção de adolescentes entre 13 e 15 anos do Nordeste, cujo agressor mais comum foi um amigo (24,3%).
– Para o estupro, os agressores mais comuns também foram namorados(as), ex-namorados(as), dates e crushes, seguidos por membros da família.
O estudo teve como objetivo investigar a prevalência da violência entre estudantes brasileiros a partir de dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), de 2015 e de 2019, por meio de uma pesquisa transversal e descritiva.
Principais achados do estudo:
– Os dados de 2019 apontam que 11,6% dos estudantes faltaram às aulas nos 30 dias anteriores à pesquisa por não se sentirem seguros no caminho entre a casa e a escola, enquanto 10,8% perderam aulas no mesmo período por se sentirem inseguros na própria escola.
– As meninas relataram maior insegurança no caminho até a escola (12,7%) em comparação com os meninos (10,5%), assim como alunos de escola pública também relataram mais insegurança no caminho para a escola (12,5%) se comparados aos alunos de escola particular (6,2%).
– A insegurança no ambiente escolar também prevaleceu entre alunos de escolas públicas (11,4%).
– Entre os entrevistados, 10,6% já se envolveram em brigas, sendo que 2,9% estavam em brigas com uso de armas de fogo e 4,8% em brigas com armas brancas. Entre aqueles que já se envolveram em brigas, prevalecem os meninos. Engajamento em brigas com uso de armas de fogo e armas brancas foi mais prevalente entre alunos de escolas públicas.
– Neste mesmo ano, 18,2% dos adolescentes relataram ter sofrido acidente ou agressão no ano anterior.
– As meninas tiveram como agressores mais comuns a mãe, o pai ou o guardião (19,6%), enquanto os meninos foram majoritariamente agredidos por outras pessoas (14,4%).
– Alunos de escolas particulares relataram maior prevalência de acidentes e agressões (26,1%).
– Comparando dados de 2015 e 2019, a prevalência do engajamento em brigas com armas de fogo caiu de 6,4% para 2,9%, enquanto o engajamento em brigas com armas brancas caiu de 7,9% para 4,8%.
Estudo sobre a violência de gênero com recorte específico pela raça/cor das vítimas.
Debate sobre a produção e uso de dados para o enfrentamento da violência contra mulheres e meninas pela perspectiva da saúde pública em evento realizado pela Vital Strategies, Universidade de São Paulo (USP) e parceiros.